Vou indicar aqui quatro lançamentos de quatro bandas as quais acompanho já algum tempo, eu já vi três delas ao vivo, já indiquei as quatro nesta série sobre rock independente, e após ouvir os quatro trabalhos, ficou notória a evolução, que essa galera do underground vem alcançando no cenário nacional.
A primeira é a banda paulistana 'O Terno 'com 'Melhor do Que Parece ', a segunda os goianos do 'Hellbenders' com o seu 'Peyote', a terceira os também goianos (como é forte essa cena de Goiais!), a 'Carne Doce' com 'Princesa' e a quarta o duo mineiro de Uberlândia do 'Muñoz' lançando 'Smokestack'. As quatro bandas são totalmente distintas uma das outras em substância sonora porém, muito talentosas e obstinadas, uma resgatando sonoridades dos 60 e 70, de Mutantes à Clube da Esquina, a segunda um stoner rock pesado, com pitadas de grunge e hardcore, a terceira o doce e amargo da 'Carne Doce', com a sua 'Princesa', um pós punk com sotaque marcante e único, graças a voz e a forma peculiar de cantar de Salma Jô, e a quarta o Muñoz, com um Stoner classudo, com muita influência do hard rock setentista. Ouvi os quatro álbuns e gostei muito.
Antes de escrever li ótimas críticas de sites especializados e por isso resolvi replicar suas resenhas, em vez de escrever as minhas, já que estão em plena sintonia com o que eu achei destes grandes lançamentos de 2016.
O Terno - Melhor do Que Parece (2016)
O peso das guitarras, a clara evolução na construção dos versos e a busca declarada por novas sonoridades. Com o lançamento do segundo álbum de estúdio, em agosto de 2014, os integrantes d’O Terno deram um verdadeiro salto criativo em relação ao elogiado debut 66 (2012). Nada que se compare ao amadurecimento expresso nas canções de Melhor do Que Parece (2016, Independente), terceiro registro de inéditas da banda paulistana e um delicado conjunto de versos, referências extraídas de diferentes épocas e possibilidades que crescem do primeiro ao último instante do disco.
Descomplicada e leve, como um típico produto radiofônico dos anos 1960/1970, a poesia de Tim Bernardes chega até o ouvinte desprovida de possíveis bloqueios. São músicas que detalham uma variedade de sentimentos essencialmente complexos (Depois que a dor passa), discorrem de forma cômica sobre os principais tormentos na vida de um jovem adulto (Nó), e ainda visitam diferentes cenários de forma nostálgica, marca da sensível Minas Gerais, oitava faixa do disco e uma das mais belas homenagens já escritas para o estado que carrega o nome da canção.
Em Culpa, música de abertura do disco, um perfeito resumo da poesia bem-humorada que abastece a obra. Enquanto guitarras melódicas e vozes em coro apontam para o final da década de 1960, esbarrando de forma respeitosa em clássicos como Pet Sounds (1966), nos versos, Bernardes discute as diferentes manifestações da culpa que bagunçam a mente das pessoas— “Culpa de fazer sucesso / Culpa de ser um fracasso / Culpa sua / Culpa de cristão”. Um mero ponto de partida para o rico catálogo de temas que a banda detalha de forma segura com o passar do trabalho.
Além do fino toque de humor, o romantismo acaba se revelando outra importante peça para a construção do álbum. “Vem, volta / Que eu estou te esperando desde que eu nasci … E o amor que eu guardava, eu guardei pra você / E a pessoa que eu sonhava eu vi aparecer”, canta Bernardes em Volta, uma apaixonada reflexão sobre os encontros e desencontros de qualquer casal, conceito também incorporado na tragicômica O Orgulho e o Perdão (“Me desculpe, meu amor / Mas não posso te perdoar”) e Não Espero Mais (“Inventei caminhos, me perdi / Me encontrei quando te conheci”).
O mesmo cuidado explícito na construção dos versos acaba refletindo em toda a base instrumental do registro. Arranjos orquestrais em Nó e Depois que a dor passa, o som empoeirado de Não Espero Mais – música que poderia ser encontrada em qualquer disco do Unknown Mortal Orchestra –, o peso das guitarras em Vamos Assumir e até o samba sujo de O Orgulho e o Perdão. Um colorido acervo de ritmos, como se o mesmo conceito explorado no trabalho anterior fosse ampliado de forma madura, efeito da profunda interação entre os integrantes da banda – completa com Guilherme D’Almeida (baixo) e Gabriel Basile (bateria).
Última canção do disco, Melhor do Que Parece garante o fechamento ideal para o trabalho. Em uma estrutura crescente, guitarras distorcidas se perdem em meio a versos consumido pelo tédio, depressão e descrença. Pouco mais de seis minutos em que o canto angustiado de Tim Bernardes se choca com um imenso paredão de ruídos, arranjos de corda, batidas e instrumentos de sopro, fazendo do ato final do registro uma turbulenta colisão de ideias, síntese inventiva de todo o álbum.
Fonte: http://miojoindie.com.br/resenha-melhor-do-que-parece-o-terno/
Hellbenders - Peyote (2016)
Faz uma cara que publicamos algo sobre o Hellbenders. A última foi tipo dois anos atrás, quando lançamos o clipe de “No Thinking”. Àquela ocasião, a banda stoner já tinha passado pelo Rancho de La Luna, no deserto da Califórnia, onde gravaram o segundo álbum. De lá pra cá a curiosidade só cresceu, e, com ela a expectativa. Findo o suspense, aqui está o produto da experiência, que ganha o mundo com o apropriado nome de Peyote.
Enquanto o primeiro álbum do quarteto goiano era uma compilação de tudo o que eles já haviam composto até então, este segundo trampo vem com músicas que transitam menos pelas diferentes praias do rock. O álbum, ao contrário, é marcado por riffs, andamentos e melodias que invocam uma potente unicidade. “A gente tem a sensação de que nesse segundo disco escrevemos num período de urgência e com influências não necessariamente diretas de artistas ou bandas que escutamos nesse tempo. Influências que transcendem a música”, diz o guitarrista e vocalista Braz Torres.
O Rancho de La Luna, vocês sabem, é o estúdio do David Catching, que fez parte do Queens of the Stone Age e do Eagles of Death Metal como guitarrista e que já gravou bandas como Kyuss, Foo Fighters e o próprio QOTSA. Parece clichê dizer isso, mas tendo o som do Hellbenders tudo a ver com a vibe de um roadie movie pelo deserto, o isolamento e imersão total dos músicos naquele ambiente só veio inspirá-los a registrarem a sua melhor performance. Nas palavras do Braz, “é como se você sentisse a presença de tanta gente que já fugiu da cidade pra fazer música naquele lugar, é bem inspirador. Com certeza se o disco fosse gravado no Brasil soaria diferente.”
Peyote foi quase todo composto em três meses no estúdio do grupo, em Goiânia. O estúdio já estava agendado e os caras só tinham alguns rascunhos, daí a questão da urgência que o Braz menciona. “A primeira coisa que fizemos questão de fazer foi gravar ao vivo”, conta ele. “Gravamos todas as ‘faixas-base’ de bateria, baixo e guitarra em cerca de cinco dias. Depois fizemos gravações adicionais de guitarras, alguns synths, efeitos, percussões e as vozes. O estúdio tem muito equipamento velho e muita coisa de butique, acho que isso foi o que definiu o som que tiramos lá. Nada muito moderno, nada muito hi tech.”
Algumas curiosidades interessantes do processo de gravação no Rancho: quando a banda chegou na Califórnia, o Mathias (engenheiro de som) disse que era uma tradição do Rancho que as bandas gravassem pelo menos uma faixa que tivesse sido feita do zero lá. Então nasceu “New Jam”. O nome que acabou ficando assim depois de tanto tempo sem um nome oficial. Outro lance: os vocais finais do disco foram quase todos as versões das vozes guias, que servem de referência para a gravação dos instrumentos.
“Quando fomos refazer as vozes acabamos percebendo que os ‘scratch vocals’, como eles chamavam, estavam do caralho. Refizemos poucas coisas”, conta Braz. E eles também conheceram um punhado de gente bacana e tiveram seu momento de realização total quando viram o Chris Goss (que já produziu discos do Kyuss, QOTSA, Stone Temple Pilots) bater cabeça curtindo o riff de “Bloodshed Around”. Segundo o guitarrista, “Tentamos usar o máximo do arsenal de guitarras e pedais do Dave Catching, mas era impossível conseguir testar tudo. É bem massa vê-lo tocando no Eagles of Death Metal com as guitarras que a gente usou no disco.” (Texto de Eduardo Ribeiro)
Fonte: http://noisey.vice.com/pt_br/blog/hellbenders-album-peyote
Carne Doce - Princesa (2016)
Princesa representa uma ruptura em relação ao disco de estreia do Carne Doce. Diferentemente do debute – que foi concebido na terra natal dos músicos, Goiânia – o mais recente trabalho do quinteto foi registrado em terras paulistanas. Longe de casa, os goianos deixaram o estúdio caseiro e se enclausuraram entre as paredes centenárias da Subestação Riachuelo (atual Red Bull Station) para confeccionar o segundo álbum da carreira. Gravado no intervalo de um mês, o disco se distancia da aridez sonora do trabalho autointitulado de 2014. Esse desligamento em relação ao primogênito está inevitavelmente subordinado à transferência da capital do cerrado para a pauliceia desvairada. No entanto, atribuir a metamorfose musical unicamente à questão geográfica seria limitá-la.
É evidente o aperfeiçoamento do senso de pontualidade entre os integrantes. Essa maior desenvoltura – o saber a nota certa na hora certa – é resultado da convivência sobre e fora dos palcos. Trocando em miúdos, os membros do Carne Doce aprenderam nesses dois anos a conversar melhor como banda. O que não significa, meramente, que hoje em dia eles toquem melhor do que na estreia. Parafraseando Nietzsche: o violino tocado pelo mais virtuoso dos violinistas pode ser confundido com um arranhado qualquer quando a sala é grande demais. É preciso se fazer ouvir. E foi isso o que Salma Jô, Macloys Aquino, João Victor Santana, Ricardo Machado e Aderson Maia fizeram nesse lapso temporal que separa Carne Doce de Princesa.
Como as rupturas deixam marcas perenes, o Carne Doce traz para o segundo disco a ironia ambivalente do primeiro. No entanto, o mais recente trabalho do grupo não surge como um apêndice do anterior, ou então como uma continuação inconsistente que busca viver das reminiscências de uma estreia notável. Pelo contrário. Princesa aparece como uma entidade independente de seu antecessor.
O segundo disco do Carne Doce oscila entre extremos. Na faixa homônima, a intérprete subverte, em uma psicodelia sacolejada e dançante, a lógica do pop romântico – na voz masculina o trecho “princesa, meu jeito vulgar vai te conquistar” soaria como um pastiche de filosofias de botequim. Em “Amiga”, uma balada melancólica marcada pelos teclados pausados, que soam como guitarras, Salma retrata a mulher que flerta com a solidão, mas que se sente sufocada pelas convenções sociais que exigem dela desenvoltura e extroversão o tempo todo.
Já em “Eu Te Odeio”, o contralto sussurrado da goiana se confunde com o dedilhado cadenciado de Aquino em uma inusitada canção de amor. Na sequência, com “Carne Lab”, o quinteto deixa sangrar sua veia mais experimental e lisérgica. Majoritariamente instrumental e com onze minutos de duração, a sétima faixa de Princesa é a mais longa da carreira e escancara a influência que grupos conterrâneos, como o Boogarins, tiveram na sonoridade da banda nos últimos anos.
Por fim, o disco chega ao clímax com a tríade “O Pai”, “Artemísia” e “Falo”, sendo esta última o ápice do triângulo musical. As três canções se complementam ao dialogarem pungentemente com a questão da desigualdade de gênero. A dominação masculina aparece abertamente em “O Pai” na figura do patriarca, cujo tamanho é a medida de todas as coisas. Nesta canção, o eu lírico reconhece resignadamente na imagem do pater familias um indivíduo opressor e extremamente incisivo. “Artemísia” – referência ao gênero botânico conhecido pelas propriedades abortivas – retoma o assunto nas entrelinhas, mencionando implicitamente os homens que ditam as regras sobre o corpo feminino ao criminalizarem o aborto e colocarem a maternidade como uma obrigação inquestionável.
A dominação de gênero volta a ser tratada explicitamente em “Falo”, momento mais crítico de todo o disco. Na canção, Salma se dá “o luxo de ser verborrágica” e faz um jogo de palavras com o verbo “falar” e o “falo” (símbolo que representa o órgão sexual masculino) que a todo custo tenta silenciá-la enquanto canta. O silenciamento pode ser observado na metáfora para o roubo de protagonismo (ao colocar o eu lírico como backing vocal da performance) ou então quando recorre ao "argumento" de que ela estaria se exaltando por estar “naqueles dias”. Contudo, em um fluxo de consciência crescente, a goiana contorna a situação e se coloca como sujeito de si mesma. “Meu bem, eu sempre fui selvática”, canta para em seguida encerrar vociferando o imperativo: “É bom que você se cuide/ Que não vai ter quem te acuda/ Quando eu quiser te capar!”
Se Carne Doce (2014) apresenta certo senso de universalidade, Princesa revela-se mais confessional ao colocar o sentimento do mundo sob os olhos do feminino. Com seu contralto reverberante e letras que crescem nos ouvidos como pequenas parábolas à la Orides Fontela, Salma conta uma história. Ou histórias. Recortes arbitrários, soltos, mas que ao serem amalgamados ficam prenhes de significado. Como em um álbum fotográfico. É um disco desordenado, como são, de certo modo, as vidas. Vidas que escapam da pena da goiana e ganham consistência nos arranjos do quinteto. Princesa é as vidas das muitas mulheres que habitam Salma. (Texto de Gabriel Nunes)
Fonte: http://rollingstone.uol.com.br/
Muñoz - Smokestack (2016)
Smokestack é o segundo full álbum do Duo de Heavy/Blues/Rock/Stoner de Uberlândia/MG, radicada em Florianópolis.
O álbum é composto de sete faixas que exploram fortemente os elementos do Blues e do Stoner Rock, além de versões das músicas “Somethimes I’m happy”, do Black Sabbath, e “Maybe, I’m a leo”, do Deep Purple.
O antecessor de Smokestack, Nebula, lançado em 2014 foi um dos melhores registros nacionais do gênero no seu ano de lançamento, e Smokestack pretende trilhar o mesmo caminho, dando ainda mais notoriedade para a dupla formada por Mauro Fontoura e Samuel Fontoura.
Em várias apresentações pelo Sul do Brasil, os Muñoz já acompanharam várias bandas como Kadavar (Alemanha), Radio Moscow (EUA), Mars Red Sky (França), Truckfighters (Suécia) e Jeremy Irons & Ratgang Malibus (Suécia).
Fonte: http://octoberdoom.com/munoz-lanca-smokestack/