quarta-feira, 25 de junho de 2014

DICA DE CINEMA - JORGE MAUTNER O FILHO DO HOLOCAUSTO



O músico, compositor e escritor brasileiro Jorge Mautner (nome artístico de Henrique George Mautner) é um homem de alma livre que, paradoxalmente, como ele mesmo diz, faz psicanálise por pressão pública. Não iremos longe no estudo da música popular brasileira se omitirmos sua obra, repleta de letras bem humoradas e melodias contagiantes. A veia de escritor é menos alardeada, mas basta lembrar o prêmio Jabuti de literatura recebido por Deus da Chuva e da Morte para se ter a real dimensão do artista completo que Mautner de fato é. O filho do holocausto assim nominou-se num livro de memórias, basilar do roteiro fílmico, por ser fruto de pai judaico e mãe vienense, herdeiro do êxodo empreendido por muitos quando do nazismo. Enfim, é mais que bem-vinda uma obra como Jorge Mautner: O Filho do Holocausto, exatamente por lançar luz sobre este brasileiro essencial.

Dirigido por Pedro Bial e Heitor D’Alincourt, o filme é todo captado em estúdio, seja na atmosfera em que Mautner lê trechos da própria biografia, depois local de encontros reveladores, ou mesmo no palco onde celebra seus principais sucessos, não abdicando das performances que o caracterizam. O início é bastante esquemático, Mautner se lê e logo após vem uma de suas canções. Apenas o fato de ouvir boa música no cinema já é alentador, mas o filme quase cai no marasmo nessa primeira e engessada parte. Felizmente logo se infiltram no tecido narrativo alguns momentos cuja diversidade ajuda a sublinhar com mais riqueza esse tipo, feito de muitos.




Figuras carimbadas de nossa arte desfilam na tela, como Caetano Veloso, Gilberto Gil e Nelson Jacobina (falecido recentemente). Eles contam as peripécias de Mautner e reeditam parcerias. Das filmagens de O Demiurgo (1972), dirigido por Mautner na casa do amigo Arthur de Mello Guimarães, em Londres, com participação de Gil, Caetano, José Roberto Aguilar, Péricles Cavalcanti, Leilah Assunção, entre outros, às passagens nebulosas, tudo passa pelo palco em música. Pode-se objetar o bom gosto estético dos cenários montados, e principalmente seu caráter restritivo. Aos diretores parece importante criar um universo paralelo e inadvertidamente falso para acolher um tipo tão sui generis como Mautner.

Sem dúvida o ponto alto de Jorge Mautner: O Filho do Holocausto é o encontro afetivo entre o artista e sua filha, Amora Mautner. A mulher reclama de seu nome (feminino de amor), causador de muitos infortúnios, sobretudo na época da escola e lembra passagens constrangedoras como a nudez constante dos pais e a vestimenta inusitada com a qual a buscavam na escola, porém sem esconder o orgulho de ser filha de quem é. Jorge Mautner apenas ri, concorda e, eventualmente, complementa, sempre com o olhar terno rebatido na mesma medida por Amora.


Mesmo estanque e formalmente desfavorável à personalidade libertária de seu biografado, Jorge Mautner: O Filho do Holocausto oferece um recorte ilustrador desse artista crente na profundidade eterna da alegria. Alguém que diz “ou o mundo se brasilifica ou vira nazista”, é ou não um tipo para lá de interessante?

Por Marcelo Müller

Fonte: http://www.papodecinema.com.br/filmes/jorge-mautner-o-filho-do-holocausto

O MEU MUNDO AGORA

É bom ter com a contradição,
é sinal de que o pensamento nunca se alivia,
de que não é imutável,
é bom não ter a mente acomodada.

Jurei a mim mesmo
não fazer mais nenhum tipo de panfletagem,
de não tomar partido,
de não ter mais partido algum.

De fato não os tenho,
mas mantenho certa militância
talvez num último resquício de esperança,
propago filosofia disfarçada de poesia! 

Sinto ainda ter uma carência de criança,
querendo entrar naquela dança,
no baile proibido, sonhando
com o beijo da menina mais bonita.

Vejo beleza no caos,
no caos das ideias,
vivo numa Alcatéia
de lobos famintos.

Supro meus desejos psíquicos,
me alimentando de versos,
sempre com muita música
me entupindo os ouvidos.

Já não desejo o belo,
continuo achando graça na palavra,
ninguém nunca me convenceu com berro,
não tenho culpa se você gritou dormindo!

Meu mundo agora não é visto do lado de fora,
meu mundo agora é da janela pra dentro,
meu mundo agora é o momento,
ele é o que eu fizer do meu mundo agora!

2014

COLETIVO EU

Não quero fazer parte,
dessas rodas 
de poesia sem alma

Dessas cirandas 
de criança,
mendigando atenção!

Desse descompromisso
com a palavra,
nesse massageador de egos 
(periféricos)

Não quero cuspir 
rimas atrás de rimas,
nem bancar o moderno,
poesia não precisa de bermuda 
nem de terno!

Quero a paz do meu silêncio,
mesmo na inquietação de minha alma,
cultivando fragmentos
no turbilhão de pensamentos
que só em mim, assola! 

2014






REGRA DE TRÊS

Preciso urgentemente alienar-me 
A ignorância é uma dadiva
O saber um castigo,
em dois me divido e me desfaço,

Preciso marcar os meus passos,
Andar em linhas retas, o meu fracasso,
lidar com o contínuo,
saber se digo ou apenas finjo!

A verdade afasta
o falso concilia
deixarei à arrogância
pra confraternizar alguma alegria!

Preciso me entorpecer 
com toda facciosa ideologia,
voltar a crer em contos de fadas
e na bondade do ser.

Preciso urgentemente alienar-me
sem alvoroço ou alarde,
Juntar-me a massa festiva
tapar os olhos em imediatismo,

Não preciso de tanto realismo,
preciso que decidam minha vida,
mergulhar nessa euforia 
ficar embevecido sem sabedoria!

Preciso calar-me 
dançar e cantar em frenesi,
Ser o braço de qualquer trabalho,
e louvar em todo carnaval:

O poeta tosco,
O gênio imaginário,
O herdeiro de qualquer Aurélio,
Vibrar com o seu cancioneiro. 

2014




segunda-feira, 9 de junho de 2014

O PESO - EM BUSCA DO TEMPO PERDIDO (HISTÓRIAS DO ROCK NACIONAL)

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Quando ouvi pela primeira vez "Em Busca do Tempo Perdido" da banda O Peso, me dei conta de que sim, há no Brasil músicos e bandas tão boas quanto as gringas. O Peso sintetizou o som do Led Zeppelin e Lynyrd Skynyrd em seu trabalho e ao mesmo tempo abrasileirou a linguagem das duas bandas. Tudo que se espera daquela sonoridade das bandas consagradas mundialmente nos anos 70 você encontra em Em Busca do Tempo Perdido. 

Como tudo o que eu queria dizer sobre essa magnífica banda já foi escrito, resolvi reproduzir o texto abaixo retirado do Blog consultoriadorock.blogspot.com.br e mais uma vez e em busca do tempo perdido literalmente, já que no Brasil, muitos talentos foram desperdiçados por não terem tido a devida atenção. Venho por meio desta tentar manter a memória musical viva e graças a Internet hoje, nossas pesquisas e a divulgação dessas pérolas perdidas estão mais acessíveis.     

Um dos grandes grupos de rock brasileiro dos anos 70 teve uma carreira meteórica, mas que deixou saudades e, principalmente, a sensação de música honesta e com muito feeling. Estou falando d´O Peso.

Tudo começou em 1972, quando Luiz Carlos Porto (voz) e um amigo, chamado Antônio Fernando Gordo, compuseram diversas músicas, e, dentre elas, escolheram "O Pente" para ser apresentada em festivais. Um destes festivais foi o VII Festival Internacional da Canção no Rio de Janeiro, o mesmo que revelou Raul Seixas com "Let Me Sing, Let Me Sing", onde os Mutantes fizeram sua derradeira apresentação com Rita Lee tocando "Mande um Abraço pra Velha", e Sérgio Sampaio emplacou "Eu Quero é Botar Meu Bloco na Rua", todas faixas que podem ser conferidas no raríssimo vinil do festival.

Porém, a canção não ficou entre as classificadas para a final, principalmente pela forte alusão à maconha, com o seu refrão "pente, pente, pente, pente prá poder fechar", levando ao retorno para o Ceará e a dissolução da dupla Luis Carlos Porto/Gordo, mas deixando Porto com vários contatos na Cidade Maravilhosa, principalmente pelo seu carisma e simpatia, o que permitiu que assinasse um contrato de três LPs com a Phillips, de onde saiu apenas o compacto de "O Pente", ao lado de Gordo. Dessa época ficou também a canção "Mundo Sol", em colaboração com o poeta Cristiano Lisboa, que infelizmente ainda não foi lançada para nós, mortais.



















Em 1974, Porto retornou ao Rio, e dessa vez começa a procurar pessoas para montar uma banda nos moldes de Allman Brothers e Lynyrd Skynyrd. Assim, funda o grupo O Peso, ao lado de Gabriel O'Meara (guitarra), Carlos Scart (baixo), Constant Papineau (piano) e Geraldo D'arbilly (bateria). O grupo passa a participar de shows, sendo a banda de apoio para Zé Ramalho na temporada que o mesmo fez na Urca em 1974.

Luiz Carlos Porto também conheceu produtores em sua primeira passagem pelo Rio, e na banda, O'Meara já tinha seus contatos, principalmente por ter participado do Projeto Salva-Terra de Erasmo Carlos, o que levou facilmente o Peso a assinar com a Polydor em 1975. O contrato com a Polydor rendeu um convite para participar do primeiro Hollywood Rock, onde o grupo apresentou toda sua energia para as mais de dez mil pessoas que enfrentaram o embarrado estádio de General Severiano no Rio de Janeiro, pertencente ao clube da estrela solitária. Entre nomes como Mutantes, Rita Lee & Tutti Frutti, Erasmo Carlos, Celly Campelo e Raul Seixas, o Peso foi uma sensação, virando a banda revelação do evento, ao lado dos também novatos do Vímana.

O sucesso no Hollywood Rock fez com que a gravadora lançasse o primeiro LP. Assim, em meados de 1975 chegava às lojas o álbum Em Busca do Tempo Perdido, uma obra-prima do rock nacional. 

O disco traz uma sonoridade similar ao Led Zeppelin, com refrões praticamente chupados dos clássicos da banda de Jimmy Page, e conseguiu vencer inclusive a censura, mesmo falando de sexo e drogas e com uma capa no mínimo estranha, onde o grupo aparece escondido dentro de um banheiro com um hipopótamo ao fundo farejando atrás daqueles cabeludos bem trajados.

O disco abre com "Sou Louco por Você", com bateria, guitarras, baixo e piano entrando aos poucos, trazendo os vocais fortes de Porto em um rockzão bem anos 70. "Não Fique Triste" começa com violões que lembram "Thank You" do Led Zeppelin, tocando a melodia que acompanha os vocais. O órgão de Papineau se faz presente, sendo que o mesmo executa um belo tema ao piano, um dos pontos principais dessa balada. Outra balada surge em "Me Chama de Amor", com um clima bem anos 60. Essa canção conta ainda com um inspiradíssimo solo de O'Meara.

O rock pesado é retomado em "Só Agora", onde piano e guitarra comandam um grande som para animar festas. Os vocais são acompanhados por vocalizações cheias de yeah-yeah-yeahs, no melhor estilo de Robert Plant, com um refrão fortíssimo. Essa faixa conta com um solo de gaita feito por Zé da Gaita, e é uma excelente canção para festas universitárias.

O lado A encerra com "Eu Não Sei de Nada", onde O'Meara mostra todo o seu talento. O riff é do nível das grandes bandas de hard americanas, com os vocais de Porto rasgando as caixas de som. Uma viajante sessão é apresentada durante a canção, onde a bateria acompanha um crescendo do órgão, teclado e guitarra, dando sequência a um funkzão construído pela base de Scart e por riffs de O'Meara, retomando o refrão. Essa canção contou com a presença de Carlos Graça na bateria, ao invés de D'arbilly.















"Blues" abre o lado B seguindo a dicotomia natural (doze compassos, três acordes, be-móis e muito feeling). A guitarra de O'Meara introduz a canção para Papineau viajar ao piano, com uma levada da cozinha que nos faz pensar estarmos em um bar americano cercado por negros rindo e bebendo, até Zé da Gaita entrar acompanhando os vocais de Porto. 

Um bluezão arrastado, com uma grande letra ("Se eu fosse um homem rico, será que você gostaria mais de mim? Meu amor dou de graça, mas você cobra tudo mesmo assim!"), que vai crescendo aos poucos. O solo de gaita leva ao solo de guitarra, onde O'Meara abusa de palhetadas Pageanas, e até as viradas de D'arbilly lembram Bonham, bem como o acompanhamento de Scart lembra John Paul Jones em "You Shook Me". Após o primeiro solo de guitarra, a canção muda o ritmo, tornando-se um rockzão de primeira, com solos alternando entre gaita e guitarra. Um clássico brazuca com muito tempero pra norte-americano nenhum botar defeito.

Outra pedrada surge com "Lúcifer", a mais zeppeliana das canções do Peso, com várias citações ao Led. O início da faixa traz mais um grande riff de O'Meara, e aqui Porto está fantástico, gritando como o personagem que dá nome a canção. É impossível não lembrar dos solos de "The Song Remains the Same" e "Celebration Day" quando O'Meara começa seus dois solos. Após o segundo solo de guitarra, as batidas do segundo riff principal de "Black Dog" são ouvidas, com O'Meara executando um terceiro solo antes de uma sessão percussiva, onde Scart comanda a viagem e o encerramento da faixa.

O slide guitar introduz "Boca Louca", mais um rockzão com O'Meara solando muito e com acordes vibrantes no encerramento. A chapante "Cabeça Feita" foi uma das mais populares. Falando sobre o uso da maconha, se tornou um clássico entre os admiradores do grupo (e da erva). O disco encerra com a acústica faixa-título, também contando com Garça na bateria. Com muitos teclados e violões, é mais uma que lembra bastante o Led de "Ramble On", principalmente pela levada do violão e pelo solo de O'Meara.

Porém, o sucesso esperado pela banda acabou esbarrando na própria gravadora, que lançou uma tiragem pequena do álbum - trazendo inclusive um belo encarte com fotos dos integrantes -, que não atingiu números interessantes de venda. Mesmo assim, lançam um compacto com as músicas "Eu Sou Louco Por Você / Me Chama de Amor", que também não obteve sucesso.

Em Busca do Tempo Perdido foi relançado em CD na década passada, trazendo como bônus a canção "O Pente".




















Várias formações passaram a fazer parte do grupo, contando com Mario Jansen, Geraldo D'arbilly, Carlos Scart, Serginho e Porto, e também como sexteto, com Porto, Carlos Scart, Geraldo D'arbilly, Serginho, Leca e Mario Jansen, inclusive com a saída de Porto, sendo substituído por Zé da Gaita nos vocais, culminando no encerramento das atividades no final da década de 70.
LP solo de Luis Carlos Porto, auto-intitulado  
Luiz Carlos Porto chegou a gravar três LPs pela Phillips que acabaram não saindo da gaveta, já que o cantor não aprovou o resultado final dos mesmos. Em 1983, lançou, pela Polygram, seu primeiro e único álbum solo, intitulado apenas com seu nome e contando com a participação dos músicos Peninha (bateria), Roberto Darbill (baixo), Marcelo Sussekind (guitarra), Julinho (piano, teclados), Marinho (saxofone) e as vocalizações de Regina, Rosana, Gracinha, Guarnieri, João Carlos e André Melito. 

Em 1984, o Peso retornou a ativa, tendo o último show daquela mini-turnê sido realizado na Danceteria Quitandinha em Petrópolis, que repercutiu bastante na mídia especializada da época. O Peso tinha na formação Luis Carlos Porto, Ricardo Almeida (guitarras), George Gordo (baixo) e Carlinhos Graça (bateria).

Porto manteve o Peso por mais alguns anos, até que em 1986, após um show em Fortaleza, envolveu-se em um grave acidente de moto, passando a sofrer de esquizofrenia e sendo obrigado a abandonar os palcos. 

No dia 26 de agosto de 2005, Darliby, Scart e Papineau se reencontraram 30 anos depois da gravação de Em Busca do Tempo Perdido, e alguns registros foram feitos. A volta do Peso para alguns shows foi cogitada, mas o problema de saúde de Porto impediu (e impede) que tenhamos nos palcos uma das mais importantes bandas do rock brazuca dos anos 70, que ao rodar na vitrola tornava impossível segurar o tesão que cada faixa passava.


O Peso reencontro em 2005


Coloque a agulha no ponto, apague as luzes, arranque a roupa da mulher e deixe que Luiz Carlos Porto e companhia comandem seu cérebro para uma noite de muita loucura e gritos de yeah-yeah-yeah!
Por Mairon Machado


Track list
1. Sou Louco Por Você
2. Não Fique Triste
3. Me Chama de Amor
4. Só Agora
5. Eu Não Sei de Nada
6. Blues
7. Lúcifer
8. Boca Louca
9. Cabeça Feita
10. Em Busca do Tempo Perdido 
Fonte: http://consultoriadorock.blogspot.com.br/2012/12/o-peso-em-busca-do-tempo-perdido-1975.html