sábado, 11 de junho de 2016

EM BUSCA DA NOVA CRIATURA


I

Mentes desocupadas não criam nada
replicam e repassam ideias a esmo
expurgam sentimentos como quando
jogamos lixo na calçada

O ócio de um pensador não existe
a ociosidade sempre foi de tempo
algo físico e nem tanto
é quando deixamos de fotografar apenas

Começamos a entender a luz em contraste da escuridão
cavucamos entre as trevas e o regalo da vida
observamos as pessoas intimamente
e todas as formas não abstratas

para dali criar a nova criatura 
subjetivamente e de facto 
Há quem escreva os livros
Há quem rabisque os espaços

Há aqueles que veem política
e há os que fazem música
há também os que regam as flores
e os que desenham casas

Mentes criativas não replicam coisas
não expurgam sentimentos feito lixo
utilizam do ócio com sabedoria
levam a sério todos os sentidos

II



Somente só
sem mais sonhos e nem ilusão
sem mais amores e nem paixão
somente o agora
somente a realidade
sobriamente só

Eu sou quem você diz que amou
fui seu par e confidente
forjamos planos 
andamos juntos
mas de sentimentos quem entende?

Tudo muda de uma hora para outra
e só com o passar do tempo
é que vemos tudo com mais clareza
foram todos meus aqueles erros
mas pequei de não prestar atenção nos teus 

E foi assim que nos perdemos um do outro
e hoje sem rancor seguimos rumos tão diferentes
até a amizade se esvaziou
por conta de uma ausência tão presente
por que amar de verdade vai além do quê se sente!

III

Eu sou só um cara comum
só falo quando é necessário falar
sou um cara crescido na leste
da cidade autorama

já fui headbanger
grunge e metido a revolucionário
romântico equivocado
hoje sou mais reservado

Aprendi que pessoas vem e vão
amores e amigos 
que a vida se finda
e que a festa um dia acaba

mas a ressaca sempre fica
que o passado sempre cobra
e que a verdade não vale à mentira
e que a ilusão é o que nos acorda

Aprendi a recomeçar do fim
que a solidão as vezes nos abraça
a olhar para dentro
e ignorar toda farsa

IV

De todos os sentimentos
a tristeza é a mais fria companheira
como a solidão que é a mais fiel
a tristeza é a amante eterna

Já a felicidade é a mais traiçoeira
ilude e é ligeira
desaparece com o menor sinal
de frustração!

As colocamos em uma balança
por que a busca real de toda uma vida
é a busca pelo equilíbrio
num caldeirão de incertezas 

V

Preciso urgentemente 
assassinar algumas lembranças
gostaria de ter uma amnésia seletiva
me esforço esquecer

mas nosso inconsciente é valente
redobra algumas lembranças nos sonhos
acordo enfurecido e de mau humor
nem todas são ruins, 

persistem aquelas que são
Não há muito o que fazer
leitura e música me ajudam
e com a distância do tempo 

Por que foi no distanciamento 
que muito se perdeu
meu juízo me julga a 
todo momento

VI

Acordei cedo num lugar estranho
gente estranha andando de um lado para o outro
acendi um cigarro e o coloquei na mureta
observando cada rosto cada silhueta

Não conhecia ninguém
não fazia ideia 
de como fui parar ali
e quem eram aquelas pessoas?

Havia uma grande galeria
vitrines de rostos a vista
um homem parou em uma delas
e trocou de cara como quem troca um chapéu 

Fiquei atônito
estava enjoado e meio zonzo
não lembrava nada do dia anterior
as ruas estavam embaçadas

Nada fazia sentido
não havia sinal de nada conhecido
como se eu acordasse em um outro país
como se estivesse em transe 

Uma mulher de vestido verde longo 
se aproximou com passos largos
bem de perto senti seu forte hálito 
como enxofre

Seus olhos eram vermelhos e cinzentos
em suas mãos notei unhas curvas e grandes
suas veias saltavam à testa
ela falou algo em uma outra língua 

Não entendi mas perguntei 
- Que lugar é este?
ela então olhou fixo para mim
e com um tom suave me disse:

_ Este é o lugar onde tudo finda
_ Um lugar sem tempo
_ Uma fenda no vento
_ Onde não se tem memória

_ Este é o albergue das almas pequenas
_ Dos sem nomes e sem rostos
_ Este é seu castigo e sua recompensa
_ Este é o lugar onde não se pertence

_ Este é o caminho sem volta
_ A estrada secreta
_ Este é o mundo sem mundo
_ Este é o seu lugar agora

Fiquei bem mais confuso
o estomago embrulhado
fechei os olhos e balancei a cabeça
a mulher desapareceu 

As ruas não tinham firmeza
parecia que eu andava em cima de gelatina
ao longe notei uma mesa
e um senhor grisalho sentado a me observar

Fui em sua direção
almejando alguma informação
que não fosse tão vago
como o daquela mulher estranha

Cheguei perto 
o rosto do senhor era branco feito gelo
perguntei: 
_ Por favor senhor
onde estou e que lugar é este?

Ele inclinou a vista para cima
e falou seco:
_ Este é o vale perdido
_ Este é o teu encerramento 

Assustado gritei:
- Quer dizer que eu estou morto!?
e o senhor sorriu
e apontou o dedo para o horizonte

Virei para ver o que ele apontava
não havia nada
a não ser aquela estrada
que tremia toda

Voltei-me o olhar
e o senhor ali já não estava
nem sua mesa
só haviam as pessoas estranhas 
andando de pressa 

VII

Sei o que você quer
o que todos queremos
a companhia dos amigos
almoços com a família
beber um bom vinho
saborear a melhor comida
gozar!

Viajar para os cartões postais
fotografar a vida
ouvir música
dançar na pista
ser amada
gozar!

Cicatrizar a ferida
ser mais justa
orgânica
participar de uma corrida
Ir ao cinema e ao teatro
conhecer um novo prato
fazer mais uma tatuagem 
ser elogiada 
gozar!

Ler um livro da moda
bancar a politizada 
discutir a situação da Síria 
fazer aulas de alguma outra língua 
apoiar alguma causa justa
pintar um quadro
criar uma horta
recitar poesia
gozar!

Sei o que você quer
o que todos queremos
e nos esquecemos
de querer 
o que nos é peculiar
o que não se compartilha
o que não é apenas uma tendência
talvez seja isso tudo o que te aflita
gozar!

tirar vantagem de alguma situação
mentir para se livrar de alguma imposição
cortar uma fila
criticar qualquer outra opinião
arrotar ou cuspir no chão
um romance proibido
trair seu marido
um relacionamento homo afetivo
só por curiosidade
enganar
eu sei o que você quer: 
gozar!

VIII

Vejo você tardiamente
querer levantar bandeiras
abrandando toda inteligência
replicando ideias carcomidas

Um fetiche ideológico
conheço tua trip egocêntrica
você não me engana
és fruto da república de bananas

Conheço bem sua ladainha
és uma Maria vai com as outras
vestida de Chita
foi-se embora seu último resquício de personalidade

Dança a dança de uma mesma roda
que não avança
és pobre de tão pobre
argumento!

Gritem ao vento
ninguém mais os ouçam
ecos de pensamentos
não fazem nem mais história!

Amam profundamente
o próprio embuste
paranoica mente 
se afundam num poço de retórica

o que sabem vocês sobre liberdade?
o que há de saberem
se todos vivem em bolhas? 
ora, veem o mundo por uma mesma ótica

Cá embaixo não somos tão pequenos
deixem de serem assim tão arrogantes
se julgam redentores de virtudes
monopolizam as ditas "boas ações"

enchem a boca de palavras vazias
palavras de ordem são só palavras 
falácias, palavras, repetidas
Deus! como repetem as mesmas coisas

Apedeutos diplomados em marcha 
saúdam seus líderes popularescos 
"Uma coisa muito simples que é muito difícil"
o que tenha dito?

Discursos insanos!
conheço bem seus planos
você vive em qual Planisfério?
desça aqui em baixo que eu lhe digo!

eu lhe ensino de bom grado
ainda tenho por ti certo estimo
sei que tu és assim confusa
ainda acreditas em fantasmas?

IX

A morte é a mãe
de todas as religiões
que se principiam
no medo patético 
que o homem
sente por ela

X

neblina fina
fria menina
meus olhos
enchem d'água

bucólica
repentina
teus ares
tão romântica

desafia
corta a carne
me sentencia 
à tua inverneira 

XI

Para Sined O' Connor

Os labirintos profundos
de nossas mentes
nos fazem convulsionar

sabemos bem
dos múltiplos 
universos paralelos

nos esquecemos
de deixar migalhas no caminho
para a volta lembrar

o teu canto sempre fora sofrido
doce canto
teu rosto de anjo caído

não deixe tua vela se apagar
suas lágrimas de cera
és ainda forte menina

agora levante-se mulher
erga-se à força de mãe
impetuosa avante

o palco é teu altar
a plateia tua amante
levante e cante!

"it's a human sign
when things go wrong"

XII

Eu sempre gostei de escrever poemas
desde muito cedo, mas nunca consigo decora-las 
a não ser quando às musico 
aí, mudam de figura quando cantadas 

Há poesia, apenas para o silêncio
que ressoam na mente de cada leitor
por isso acho tão difícil recita-las 
eu gosto de ler poemas

Sou leigo em diferenciar alguns estilos
talvez seja o fruto de minha educação básica
então as leio admirando o ritmo
além de cada palavra

Gosto do som lírico
que cantam em minha cabeça
escrevo sem muito senso crítico
para quê a inspiração nunca me desapareça!

XIII

Contei quinze pipas no ar
o sol já se punha
vi gatos a pular
de uma telha a outra

belo fim de tarde
na periferia
domingo calmo
quem diria!

Ouvindo Close to me do Cure
há muito não ouvia
letra obscura e triste
música que me causa uma boba alegria

O país todo desconfiado
apreensivo
que a semana seja boa
para toda gente de bem

Ando pensando muito
em todo mundo
tenho uma atração masoquista
por manchetes de jornais

Me deprimem as notícias
mas não sou o mesmo cara de antes
estou mais oblíquo
a ouvir a solidão

XIV

Quer fazer uma revolução ele diz, mas não consegue derrubar o opressor de dentro, aquele ditadorzinho que o impede de andar para frente, que regula sua vida e principalmente o seu pensamento. 

XV

Quero ser apolítico 
não apocalíptico
menos sensível
não insensível

sentir fome
e não ser faminto
ser um pouco mais vaidoso
mas nunca um narciso 

ser mais calmo
mas nunca passivo
ser mais sincero
primeiro comigo

Menos teimoso
mas nunca indeciso
cauteloso
mas sempre ousado

Ser mais ambicioso
mas nunca demasiado 
materialista 
gosto da minha vida simplista

uma nova criatura
dentro de outra
daquela que fica
demarcando meu espaço!

XVI

O cultivo da política da inveja
em toda história não fez justiça alguma
germinou tardiamente para as bandas de cá 
frutos podres foram cultivados
no hemisfério sul 

Vício
generalizado 
cegas paixões
polarizados
com sufixos paralisantes

sufocam 
a todo instante
um país inteiro
que sempre andou à margem
de povos mais civilizados

troquem a inveja por orgulho
a preguiça por conhecimento
não é só uma questão de temperamento
devemos pôr este país adolescente 
na rota correta do crescimento

As páginas velhas do livro
sempre foram as verdadeiras chaves
para o despertar da mente
que abrem todas as portas
são elas as melhores sementes
para um cultivo sustentável 

Para uma sociedade sadia
não devemos erguer muros
que vão nos atrasar ainda mais 
chegou a hora de um real levante
que nos leve adiante
para o esperado país do futuro

XVII

Violeta
azul
era a cor do mar

rancor
gracejo 
a cor púrpura 

flor
a desabrochar
sua volúpia

sentinelas
nos observam
entre nevoeiros

areia
semeia
andrógina

coagulante
vermelha
escorre

o ventre
a fruta
amadurece

morre
passa
apodrece

por que você não fala comigo
por favor me diga alguma coisa
espero há tempos ouvir
sua voz acolhedora!

XVIII

Olhem só
esta é uma coisa do qual não gosto:
Preocupação!

Tudo me preocupa
Sinto temor por outrem 
tenho preocupação que é a minha
não contente eu tomo posse
da preocupação dos outros também

Preocupação tem a ver com medo
e ter medo é um saco!
medo tem a ver com estar sóbrio 
e estar sóbrio é outra preocupação que se tem!

Eu me preocupo
basicamente com minha família
depois vem o mundo
e a vizinhança
dentro e fora do muro

Me preocupo com os bons amigos
só não me preocupo com inimigos
e fim de papo!

XIX

Penso que um poema precisa ser simples
não pode ser muito enfeitado
Sempre muito bem escrito
nada rascunhado

XX

Vivemos sob a ditadura linguística
do General Politicamente Correto
Pois é fácil condenar a língua
mais fácil ainda é julgar o verbo

Orwell estava certo
com a construção de sua novilíngua
uma forma de controle
nas mãos dos próprios controlados
o censor sendo ele próprio o censurado
diminuindo toda construção racional

Maquiamos assim posturas
para evitar o bom senso
confeccionamos máscaras
nos tornamos anônimos 
pois nos falta coragem
de sermos nós mesmos

Eis o ponto:
Vivemos na era dos ofendidos
e que culpa tem a língua?
e que culpa tem a arte?
e que culpa tem a palavra?
a não ser a culpa do existir
e a culpa de permanecer

Jovens carolas 
fingem sua falsa moral
tão inconscientemente 
acreditam ser modernos
preferem mentir a entender
que não existe liberdade
onde existam tantas restrições
Não estou falando em leis
este é apenas um tributo à linguagem 

Não acabamos com preconceito algum
maquiando a cada expressão
acabamos com o preconceito
acabando com o medo
e toda e qualquer dúvida
criando na cultura
uma real educação

É o que eu tenho dito
o que penso, escrito
sou deveras objetivo
me preocupa apenas a razão

Minha poesia é livre até mesmo de ser apenas poesia!

XXI

Canjica
adoro canjica
gosto também de arroz doce
e doce de abóbora com coco
doces típicos desta época do ano

O sabor simples da vida
está nos pratos de mãe,
e de vó, e de tias
de mães de amigos

Hoje tenho apenas duas bebidas preferidas:
café e água
consumo muito os dois, todos os dias
os dias inteiros

Eu não gostava de bolo de banana
mas hoje sou capaz de comer um todo
comida é vida 
é arte

Sempre fui bom de garfo
as vezes me atrevo cozinheiro
hoje estou mais magro
aprendi a comer melhor
saboreando primeiro

XXII

Sim, eu acredito
que Deus viva
e que Cristo existiu
que és também Deus
está documentado

Acredito em tudo o qual o homem dá nome
antes de Deus ainda não havia o homem
e antes do homem havia Deus?

Penso que eu devo ter fé
por quê fé é coisa do homem
pois dizem que bicho não tem fé
e eu não sou bicho 

XXIII

Arte não deve tomar partido político
pois a arte é política por natureza
tento fazer com quê minha poesia 
se desvencilhe de qualquer ideologia
para quê ela seja um tanto verdadeira

Ideologia é prisão invisível 
quando toma para si a arte por inteira
e para a pura arte é necessário liberdade
pois os heróis dos artistas são outros artistas 
que vencem a sua maneira

Não acredito em nenhum artista que levante bandeira, 
artistas políticos não deveriam 
ser levados muito a sério,
por que o poder hipoteca a arte
em troca de favores escusos
e então o proposito da arte não seria mais arte 

Descaracterizamos a arte
quando elegemos "salvadores"
sei que toda ideologia peca
por que são apenas teses
o homem pode ser ideólogo 
mas o artista deve ser um observatório do homem

A arte deve ficar no campo filosófico, 
da expressão,
pode até falar em ideologia e política
mas não é essa sua função,
a função da arte é a de ser crítica
questionadora e empírica em toda questão

Arte não deveria ter lados
o lado da arte é o lado da arte
nem esquerda e nem direita
nem de fora e nem de dentro
deveria ser puro questionamento
e eternamente inquieta.

XXIV

Penso que já chegamos no futuro
aquele dos filmes de ficção científica

Imaginem um homem de séculos atrás 
andando em uma metrópole de hoje

De certo causaria nele uma enorme vertigem
barulho, embrulho, sirenes, ruídos, arranha-céus, aviões, carros, helicópteros, celulares...

Acredito que cada dia mais trocaremos nossas realidades, que será cada vez mais virtual e menos realidade de fato

Até o dia em que nos esqueceremos da realidade de fato, que para nós será cada vez mais virtual.

XXV

Utopia das utopias

Não vai ter golpe
não vai mais ter
demagogia em demasia
populismo desmedido
a palavra hipocrita
Não vai ter mais
coletivismo burro
voto às cegas
não vai ter mais
partido dividindo 
toda gente de bem
todo trabalhador
não vai ter mais
petróleo escorrendo
pelos esgotos
discursos insanos
frases desconexas
alienação das massas
subterfúgio de manobras
intelectuais idealistas
vendendo sua arte
suas verborragias e falácias
o futuro hipotecado
esmolas estatais
cordas nas costas
educação deseducada 
mentes controladas
o mito à ideologia
não vai mais 
existir "sociedade ideal"
"salvadores"
"messias"
corrupção d'alma 
desigualdades reais
crime e castigo
fome e desnutrição
preconceito e racismo
menor delinquente 
violência contra a mulher
proposta sem projeto
promessas vazias
ingenuidade
não vai mais
ter cultura seletiva
quem dera 
Utopia das utopias

XXVI

Minha poesia 
é deveras controversa
nunca se alivia
com aqueles
versos sempre frescos

XXVII

Escrever é uma forma de organizar o pensamento
um exercício intelecto de fomento
para projetar o inquietante
que vem de dentro

XXVIII

Belo és Jasmim
perfumado o alecrim
da relva suas duras rosas
que nascem da primavera jardim

e dança o rio que corre
correntezas que batem forte
desmancham tuas vestes na pedra
e morrem no mar esbelto 

toda natureza posa 
sob o sol damasco
brota à vida verde

damas da noite
exalam fragrâncias
teus frutos, veneno

notívagos seres 
flox noturna 
se escondem ninfas 
à nova criatura
a vida breve das prímulas 

XXIX

Ideias solúveis
brotam na mente
poesia marginal

a breve insensatez
da desobrigação 
há de termos com a palavra

escrever daquilo tudo
que não quer dizer absolutamente nada
sem cerne da questão alguma

discorrer àquela conversa breve
só com intuito de coloca-la vazia 
questionar sem querer respostas

como qualquer conversa boba
que temos com um estranho que encontramos na rua
papeando sobre o tempo, se vai ou não ter chuva

XXX

Penso que o melhor laboratório
do homem é outro homem
Hoje fui ao barbeiro
cortar o cabelo

para cada notícia na TV
aquele homem simples,
trabalhando
soltava um discurso inteiro

Tudo tão preto no branco
em um só solavanco
impressionante o teu discernimento
não se esquivava de assunto algum

de economia à política
falando de forma simples e coloquial 
trocou algumas vezes palavras
como empreiteira por "empereira"  

Nessa altura da conversa
os erros da língua já não me interessava mais
para mim estava tão claro o que ele dizia
que fiquei totalmente vidrado 

ele sabia bem o que falava
não era nada viciado 
me disse que veio do sertão 
conhecia bem a diferença do real e do prometido

o valor do trabalho honesto
a tentação do diabo do corruptor
o preço da gasolina e do feijão
e o que causava a inflação

Explicou de forma clara e só sua
a maldição do populismo
me disse que não completara nem a terceira série 
e que sabia bem a importância que tem um papel 
e o que nele estivesse escrito.



Igor Motta
2015-2016


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